sexta-feira, 23 de fevereiro de 2018

VIDA LONGA E POBREZA: O ESTRANHO CASO DA COREIA SUL


A população mundial está a envelhecer rapidamente, as projeções das Nações Unidas preveem que a população de 65 e mais anos da Coreia do Sul leve 18 anos para passar de 7% para 14%, valor que mede a rapidez do envelhecimento, quando a França levou 115 anos, a Suécia 85 anos e Portugal 42 anos (aqui).
A rápida transição demográfica verificada nas últimas décadas desafia as sociedades a adaptarem-se ao forte impacto que o envelhecimento populacional tem em todas idades, nas comunidades, obrigando a adaptações no mercado de trabalho, nas famílias e nas políticas públicas focadas nos serviços de saúde, nos cuidados de longa duração e na segurança social.
The five stages of demographic transition
O envelhecimento é uma conquista civilizacional do pós-guerra (II Guerra Mundial), consequência dos progressos sociais, económicos e biomédicos, mas à medida que as pessoas envelhecem, manifesta-se também uma crescente heterogeneidade entre as pessoas idosas, na sua saúde e no seu funcionamento físico, mental e cognitivo, assim ao mesmo tempo que alguns têm a capacidade de funcionamento de uma pessoa de 30 anos, outros necessitam de ajuda a tempo inteiro para as atividades da vida diária.

O caso da Coreia do Sul é paradoxal, uma vez que ao mesmo tempo que existe uma forte probabilidade (90%) da esperança de vida à nascença atingir em 2030 86.7 anos para as mulheres e mais de 80 anos para os homens, cerca de 46% da população idosa vive em pobreza relativa, 1/4 vive sozinha e apenas 1/3 dela tem direito a uma pensão.(aqui)
Poverty rate OECD
Num país que saído da guerra, atravessou um período de extrema pobreza, a geração dos mais velhos apresentava características que contribuíram para um maior longevidade:um diminuto consumo de tabaco, uma baixa prevalência de sedentarismo e obesidade e uma das mais baixas taxas de doenças cardiovasculares nesta faixa etária. Mas à medida que a prosperidade económica se desenvolvia a sociedade era marcada por profundas modificações sociais que rompiam o contrato social de uma comunidade onde os mais novos cuidavam dos mais velhos: a competitividade crescia, a população saía dos campos para as cidades, a concorrência tornava-se implacável por um emprego ou por melhores notas, a população idosa era empurrada para a pobreza, tendo que comprovar que seus filhos não estão dispostos ou são incapazes de lhes prestar apoio para serem elegíveis para o apoio do governo. Os elevados níveis de solidão e depressão levaram a um aumento dramático do suicídio entre os idosos, passando de 34/100.000 em 2000 para 72/100.000 em 2010. (aqui) (aqui) (aqui)


domingo, 11 de fevereiro de 2018

45% A 60% O IMPACTO DOS DETERMINANTES SOCIAIS NA SAÚDE DAS PESSOAS, 10 ANOS SOBRE A PUBLICAÇÃO DO RELATÓRIO DA OMS " CLOSING THE GAP IN A GENERATION"


Em 2018 passam 10 anos sobre a apresentação do relatório “Closing the gap in a generation: Health equity through action on the social determinants of health” traduzido para português como “Redução das desigualdades no período de uma geração: Igualdade na saúde através da ação sobre os seus determinantes sociais” (aqui) elaborado pela Comissão para os Determinantes Sociais da Saúde, criada em 2005 por iniciativa do secretário-geral da Organização Mundial da Saúde (OMS) JW Lee (aqui).

A Comissão liderada pelo Professor Michael Marmot foi incumbida de recolher, sistematizar e sintetizar a informação disponível sobre os determinantes sociais da saúde e o seu impacto nas desigualdades na saúde, produzindo recomendações para a ação sobre as desigualdades no período de uma geração.
A OMS definiu os determinantes sociais da saúde como os fatores que impactam a saúde e o bem-estar: as circunstâncias em que, nascemos, crescemos, vivemos, trabalhamos e envelhecemos. Incluem o rendimento e a distribuição do rendimento, a educação, a habitação, a segurança alimentar, o emprego e as condições de trabalho, o desemprego e a segurança no trabalho, a rede social, a inclusão e a exclusão social, os serviços de saúde.

Após a publicação do relatório, sucederam-se as tomadas de posição, das quais salientamos: em 2011 a Conferência Mundial sobre Determinantes Sociais da Saúde organizada pela OMS no Rio de Janeiro no dia 21 de outubro, durante a qual os 125 países participante aprovaram a Declaração Política do Rio sobre Determinantes Sociais da Saúde (aqui), onde se comprometiam a implementar uma abordagem sobre os determinantes sociais da saúde com o objetivo reduzir as desigualdades em saúde; em Maio de 2012 a 65.ª Assembleia Mundial de Saúde, onde os países presentes aprovaram a Declaração do Rio e as suas recomendações, tomando medidas para apoiar as 5 ações prioritárias recomendadas na declaração e finalmente aprovação por parte da Associação Médica Mundial (AMM) da Declaração de Oslo sobre os Determinantes Sociais da Saúde, revista e atualizada, adotada durante a 66ª Assembleia Geral da AMM (aqui), em Moscovo na Rússia em outubro de 2015 onde se estabelece a importância dos determinantes sociais de saúde na ação dos médicos, das Associações Médicas nacionais e da AMM.

Em 2018, 10 anos passados sobre o relatório da Comissão para os Determinantes Sociais da Saúde, a injustiça social continua a matar em larga escala, as desigualdades na forma como nascemos, crescemos, vivemos, trabalhamos e envelhecemos estão bem visíveis nas desigualdades na esperança de vida à nascença entre países (aqui), uma criança nascida na Serra Leoa tem uma expectativa média de vida de 50,1 anos, enquanto uma criança nascida no Japão tem uma esperança de vida à nascença de mais 33.6 anos (83.7), cerca de 1 geração e meia mais que um país de renda baixa, entre regiões ou mesmo dentro de uma cidade, são bem conhecidas as diferenças de esperança de vida entre os habitantes da cidade de Glasgow (aqui), onde existe uma diferença de 15 anos na esperança de vida à nascença para os homens que nasceram nos bairros mais desfavorecidos (66.2 – 81.7) e de 11 anos (73.1-84.1) para as mulheres, sensivelmente a mesma esperança de vida à nascença de um homem nascido na Índia (66.9) ou na Coreia do Norte (67. O mesmo acontece nas cidades de Filadélfia (aqui) ou em Miami (aqui).


Podem até existir algumas controvérsias acerca de qual é magnitude dos determinantes sociais na saúde das pessoas e das comunidades, mas como bem retrata a compilação do King´s Fund (aqui), têm um peso enorme na saúde das pessoas, variando de acordo com os estudos entre 45% a 60% no peso total dos determinantes da saúde humana. Sendo em conjunto com a universalização dos cuidados de saúde, determinantes essenciais para melhorar o estado de saúde das populações e reduzir as desigualdades em saúde.

Em Portugal necessitamos de mais estudo e de mais atenção das autoridades nacionais e da academia para conhecermos melhor os fatores que impactam a saúde e o bem-estar: as circunstâncias em que, nascemos, crescemos, vivemos, trabalhamos e envelhecemos, em vez de focarmos a discussão sobre o funcionamento dos serviços de saúde.