A Comissão para o Estudo da Equidade e das Desigualdades em Saúde das Américas, criada em maio de 2016 pela Organização
Pan-Americana da Saúde, apresentou e publicou ontem, dia 24 se setembro, o
sumário executivo do Relatório “SOCIEDADES JUSTAS: EQUIDADE EM SAÚDE E VIDA
DIGNA” (aqui)onde apresenta o quadro conceptual para o estudo da equidade e das
desigualdades nas Américas com base na estrutura utilizada pela Comissão da Organização
Mundial de Saúde para os Determinantes Sociais da Saúde, coerente com os
Objetivos para o Desenvolvimento Sustentável definidos pela Assembleia Geral
das Nações Unidas em 2015, aprofundando temas como o colonialismo, o racismo
estrutural e a importância das relações com a terra, dando um maior ênfase ao
meio ambiente e às mudanças climáticas e um maior relevo às iniquidades por
razões de género, origem étnica, orientação sexual, ciclo de vida e
incapacidade, reconhecendo as inter-relações entre estes fatores e sublinhando
a necessidade de conseguir uma maior equidade em saúde e uma vida digna como
resultado desejado.
O relatório apresenta para além do quadro
conceptual, um resumo do diagnóstico das desigualdades em saúde no continente
americano e 12 recomendações para ação política a desenvolver por cada um dos
países do continente americano “As part of this process, each country should
review the priority objectives, as set out by this Commission, adapt them to
their specific context, and identify the resources, legislative changes, and
capacity-building needed to take forward the specific actions. The
achievement will be more just societies in which all people are enabled to lead
dignified lives and in which health equity is a realizable goal.”
No dia 24 de setembro, o presidente da
Comissão, o professor Michael Marmot, publicava um comentário na revista Lancet (aqui) onde antecipava alguns aspetos do relatório agora publicado. Começando por abordar as desigualdades entre
países fazendo uso quer da esperança de vida à nascença quer do nível de
rendimento, dando como exemplo as diferenças entre a esperança de vida à
nascença do país mais rico do mundo os Estados Unidos (59.000 $US dólares por
pessoa), quer para homens (76 anos) quer para mulheres (81 anos) e o país mais
pobre das Américas, o Haiti (1.800 $US dólares por pessoa), onde a expetativa
das mulheres se cifra nos 66 anos e a dos homens nos 61 anos, chamava a atenção
para as exceções da Costa Rica e de Cuba (com rendimentos por pessoa na casa dos
16.000 $US dólares), com expetativas de vida superiores em um ano aos Estados
Unidos e para as diferenças entre os Estados Unidos e o Canadá (o país com
maior esperança de vida à nascença das Américas), favoráveis ao Canadá, mais 3
anos de vida para as mulheres e mais quatro para os homens, quando o rendimento
por pessoa do Canadá é ¼ mais baixo do que nos EUA.
Mas as exceções não vêm apenas das diferenças
entre países, elas também são visíveis dentro de cada país, dando a Comissão
como exemplo as diferenças registadas entre a esperança de vida à nascença dos
homens dos bairros mais pobres de Baltimore, próxima da verificada no Haiti, e
a dos homens dos bairros mais ricos de Baltimore com uma esperança de vida
maior que a dos homens da Canadá, e a esperança de vida mais desfavorável entre
os homens com menor escolaridade no Chile, que podem esperar viver menos 11
anos do que um homem chileno com educação universitária.
Ao longo do relatório as evidências reunidas
pela Comissão mostram que muitas doenças são socialmente determinadas, as
desigualdades em saúde surgem devido às condições em que as pessoas nascem, crescem,
vivem, trabalham e envelhecem. O efeito dos determinantes socais da saúde está
patente desde o início da vida, na maioria dos países das Américas o
desenvolvimento das crianças e os seus resultados em educação, rendimento,
saúde e bem-estar estão alinhados com a situação dos pais. A possibilidade de
uma criança morrer antes dos 5 anos está vinculada ao rendimento dos pais,
quanto menor o rendimento maior a mortalidade, na Guatemala a taxa de
mortalidade para menores de 5 anos era de 56/1.000 para o quintil mais pobre, enquanto
a mesma taxa de mortalidade era no quintil mais rico de 7/.1000.
Mas para além de abordar as desigualdades
sociais e económicas a Comissão identificou as mudanças climáticas, as ameaças
ambientais, a relação com a terra e o contínuo impacto do colonialismo, do
racismo e da história da escravatura como fatores que protelam o objetivo da
maioria dos americanos levarem uma vida digna e desfrutarem do mais alto padrão
de saúde possível.
A Comissão dá ainda uma atenção particular à
situação dos povos indígenas e dos afrodescendentes, os primeiros representam 35
a 50 milhões de pessoas na América do Sul, do Caribe da América Central cerca
de 13% da população, 5.2 milhões nos Estados Unidos e Alasca e 1.4 milhões no
Canadá e os segundos cerca de 200 milhões de pessoas no continente americano,
incluindo o Canadá e os Estados Unidos, sublinhando o papel do colonialismo e o
racismo estrutural nas desigualdades em saúde. Ser pobre, nativo, mulher e sem
terra, pode causar mais inequidades em saúde do que ser afetado isoladamente por
qualquer um destes eixos de desigualdade.
Uma boa saúde requer não só acesso a cuidados
de saúde de qualidade, mas também a ação sobre os determinantes sociais da
saúde, as recomendações da Comissão para o Estudo da Equidade e das
Desigualdades em Saúde das Américas seguem o quadro conceptual e exortam os
países a reduzirem as desigualdades em saúde, a enfrentarem os problemas da
educação, do emprego, dos rendimentos e da segurança, ao mesmo tempo que devem
olhar de forma determinada para a defesa dos direitos humanos e para o
colonialismo intrínseco à história do continente americano.