terça-feira, 29 de agosto de 2017

TER UM TRABALHO DE MÁ QUALIDADE PODE SER PIOR PARA A SAÚDE DO QUE ESTAR DESEMPREGADO

No passado dia 10 de Agosto, foi publicado na revista International Journal of Epidemiology, um estudo da Universidade de Manchester “ Re-employment, job quality, health and allostatic load biomarkers: prospective evidence from the UK Household Longitudinal Study” que tinha como objetivo comparar a saúde das pessoas que permaneceram desempregadas com aquelas que passaram a ter um trabalho, e examinar os impactos para a saúde em deter um emprego de boa ou má qualidade, uma vez que se sabe desde há muito: que o desemprego está associado à falta de saúde; que são conhecidos os benefícios para a saúde da saída da condição de desempregado e que um trabalho de qualidade pode trazer benefícios para a saúde e para o bem-estar do indivíduo.

Para essa finalidade os autores consideraram a definição da OCDE para um “trabalho de qualidade” – Earnings quality, Labour market security, Quality of the working environment, - (aqui) tendo examinado os bio marcadores relacionados com o stress crónico (HbA1c, triglicéridos, proteína C reativa, fibrinogénio, DHEA-S, Clearance de Creatinina, Colesterol-HDL rácio, pressão arterial sistólica, IMC, Índice alostático) (aqui).

No estudo que envolveu mais de 1000 participantes desempregados entre os 35 e os 75 anos durante os anos de 2009-2010, os autores encontraram um padrão claro de níveis de stress crónico mais elevados nos desempregados que mudaram para empregos de má qualidade, quando comparados com os que se mantiveram desempregados.
Em resumo, os pesquisadores descobriram evidências de que os adultos anteriormente desempregados que se mudaram para empregos de baixa qualidade tiveram riscos elevados para uma série de problemas de saúde, em comparação com adultos que permaneceram desempregados.

Estes resultados contrariam a crença de que qualquer emprego, mesmo um trabalho de má qualidade, está associado a uma melhoria do bem-estar e da saúde.


A qualidade do emprego não pode ser desconsiderada do sucesso no emprego dos desempregados. Assim como o trabalho de qualidade é bom para a saúde e para o bem-estar dos trabalhadores, também devemos lembrar que o trabalho de má qualidade pode prejudicar a saúde.

VER:

WHO - HEALTHY JOB (aqui)
6.º Inquérito Europeu sobre as Condições de Trabalho:2015 (aqui)
Employment, Work And Health Inequalities: A Global Perspective (aqui)
OECD - Job Quality (aqui)

sábado, 26 de agosto de 2017

PORTUGAL - 2015 - DESPESAS PÚBLICAS EM SAÚDE ABAIXO DA MÉDIA DA UNIÃO EUROPEIA

Os dados publicados, ontem dia 2017-08-25, pelo Eurostat referentes à despesa pública em saúde nos países da União Europeia, mostram que Portugal despendeu 6,2% do PIB em despesas públicas de saúde em 2015, valor inferior ao da média dos países da União Europeia onde a despesa pública em saúde se cifra em 7.2% do PIB. (aqui)

Este valor confirma a manutenção em 2015 da quebra verificadas nas despesas públicas com a saúde em % do PIB, verificada desde 2012, documentadas anteriormente.(aqui)
Recordamos que “Relatório português do Health Systems in Transition 2017” (aqui)publicado no passado mês de Abril tinha mostrado que ao longo dos anos de crise económica, ao mesmo tempo que se verificava uma forte diminuição do Produto Interno Bruto de Portugal (menos 5.4% entre 2010 e 2013) e das despesas totais em saúde em % do PIB de 12.5% no mesmo período, diminuía a despesa pública em saúde e diminuíam de uma forma significativa as despesas em cuidados de saúde per capita, como consequência das medidas propostas pela Troika e implementadas pelo XIX governo português, provocando uma forte redução no financiamento do SNS e um aumento das despesas das famílias, que afetaram negativamente a qualidade e a acessibilidade aos cuidados de saúde.


A par destes efeitos sobre a qualidade e a acessibilidade aos cuidados de saúde, verificou-se que as medidas de austeridade impostas pelos organismos internacionais como o FMI e a Comissão Europeia, bem como pelos diversos governos nacionais, provocaram o aumento das desigualdades em saúde, e a previsível degradação do estado de saúde das populações,(aqui)(aqui)(aqui) incluindo a estagnação ou mesmo um retrocesso da melhoria da esperança de vida à nascença.(aqui

domingo, 6 de agosto de 2017

AS ONDAS DE CALOR MATAM SILENCIOSAMENTE AS PESSOAS INVISÍVEIS E SEM VOZ

Na semana em que o serviço meteorológico europeu (Meteoalarm) alertava para uma onda de calor que afetava em particular a Itália e a região dos Balcãs, colocando dez países em alerta vermelho, devido ao aumento das temperaturas máximas, atribuindo-lhe o nome de Lúcifer, a revista Lancet Planetary Health de Agosto de 2017, publicava o estudo “Increasing risk over time of weather-related hazards to the European population: a data-driven prognostic study” onde se concluía que o aquecimento global poderá provocar na Europa catástrofes relacionadas com o clima que afetarão cerca de 2/3 da população no ano de 2100 e multiplicarão por 50 as mortes verificadas no período de 1981-2100.
Meteoalarm
De acordo com a investigação verificar-se-á um gradiente latitudinal, desfavorável ao Sul da Europa, onde a taxa de mortalidade prematura devido ao clima extremo entre os anos em estudo (2071-2199) poderá atingir cerca de 700 mortes anuais por milhão de habitantes tornando-se no maior fator de risco ambiental para a saúde.
Lancet Planetary Health
O estudo conclui ainda que alguns grupos sociais podem ser mais afetados do que outros, “In particular, the most vulnerable will be elderly people and those with diseases..., as well as the poor...”, confirmando a evidência científica publicada desde que Klinenberg estudou a Onda de Calor que afetou Chicago em 1995 (aqui), descobrindo que as 700 mortes verificadas só podiam ser explicadas através de uma “autópsia social” e concluindo que estas mortes não eram consequência “natural” da Onda de Calor mas eram antes moldadas pelo contexto e pela organização social humana.

De acordo com Klinberg, em Chicago morreram as pessoas idosas, as pobres e as isoladas, concluindo que sem a “desnaturalização” do evento a relação das desigualdades sociais e políticas com a mortalidade observada continuaria escondida.

Ainda recentemente no Arizona (aqui), no passado mês de Junho, as “ ilhas de calor” afetaram em particular os mais vulneráveis, as pessoas idosas, as pessoas doentes, com capacidade fisiológica e comportamental reduzida para termorregulação, e os mais pobres, arredados dos meios tecnológicos que possam mitigar os efeitos das ondas de calor.

Num mundo cada vez mais quente, e em sociedades cada vez "mais frias" que voltam as costa aos mais vulneráveis, o calor é um assassino invisível, que não liquida todos por igual. A história das ondas de calor é uma história económica e social, só compreendida à luz dos determinantes sociais da saúde