segunda-feira, 22 de julho de 2019

ENTRE AS 56 ECONOMIAS COM CUIDADOS DE SAÚDE MAIS EFICIENTES - PORTUGAL ESTÁ NO 18.º LUGAR


A notícia é de 19 de setembro de 2018, alguns dos dados até são de 2015, mas vale a pena divulgá-la agora que a agenda mediática foi tomada pela difusão diária de notícias negativas para o Serviço Nacional de Saúde. Não porque este não tenha prolemas ou dificuldades, mas apenas para relativizá-los.
Determinants of Healtb - Helath is more than medical care

A agência de notícias Bloomberg, para além de publicar o Ranking dos países mais saudáveis do mundo “Bloomberg Healthiest Country Index” divulgou em setembro de 2018 o “Blomberg Health Care Efficiency”. Um índice de eficiência em saúde criado pela Blomberg para classificar os sistemas de saúde das 56 maiores economias mundiais, que tenham cumulativamente uma esperança média de vida à nascença de pelo menos 70 anos, um PIB per capita superior a US$ 5.000 e uma população de pelo menos 5 milhões de habitantes.



De acordo com “Blomberg Health Care Efficiency” que coloca Portugal na 18.ª posição com uma subida de 8 lugares em relação à anterior edição, os cinco primeiros lugares são repartidos entre Hong Kong, Singapura, a Espanha, a Itália e a Coreia do Sul, nos primeiros 20 lugares encontram-se 7 países europeus (Noruega, Suíça, Irlanda, Grécia, França, Portugal e Finlândia), 2 do Médio Oriente (Israel e Emiratos Árabes Unidos)3 países da Ásia (Japão, Taiwan e China) 2 países da Oceânia (Austrália e Nova Zelândia), 2 das Américas (Canadá e México).

Algumas das nações mais ricas do mundo como o Reino Unido (35.º) a Alemanha (39.º) ou os Estados Unidos da América (54.º) encontram-se em lugares inusitados para a maioria dos cidadãos, uma vez que a informação habitualmente divulgada raramente compara os resultados obtidos em saúde medidos pela esperança de vida à nascença com a riqueza da economia e os gastos em saúde.

quinta-feira, 18 de julho de 2019

EQUIDADE E TAXAS MODERADORAS NO SNS - MODERAÇÃO OU BARREIRA AO ACESSO


Ao longo da década de 80 sucedeu-se uma prolongada batalha política e jurídica em torno da introdução de taxas moderadoras no Serviço Nacional de Saúde (SNS) português.

Previstas no artigo 7.º da Lei n.º56/79 de 15 de setembro,  o Serviço Nacional de Saúde onde se afirmava Lei de Bases da Saúde também conhecida pela Lei Arnaut que criavaque “O acesso ao SNS é gratuito, sem prejuízo do estabelecimento de taxas moderadoras diversificadas tendentes a racionalizar a utilização das prestações” as taxas moderadoras teriam de ser posteriormente reguladas.

Foi assim que durante a vigência dos VIII Governo Constitucional e IX Governo Constitucional, os ministros dos Assuntos Sociais e da Saúde procuraram estabelecer comparticipações fixas para medicamentos e taxas moderadoras no acesso a cuidados de saúde. Contestadas pelo Provedor de Justiça são consideradas inconstitucionais pelo Tribunal Constitucional em 1983 e em 1985 não por razões substantivas, mas por não terem sido estabelecidas por decreto-lei ou com base num decreto-lei. (aqui)(aqui)

Aprovadas de novo pelo X Governo Constitucional num ambiente de forte contestação política, através do Decreto-Lei n.º 57/86 e fixadas pela Portaria nº 334-A/86, de 5 de julho, nos serviços de urgência hospitalares e nos serviços de atendimento permanente, nas consultas dos hospitais e dos centros de saúde e em outros serviços públicos de saúde foram de novo submetidas ao Tribunal Constitucional que as declarou constitucionais em 1989 (aqui), acabando por se aplicarem apenas aos meios complementares de diagnóstico, uma vez que o próprio Governo perante o clima de forte contestação revogasse as taxas moderadoras nos atendimentos de urgência e nas consultas, tanto nos Hospitais como nos Centros de Saúde na Lei do Orçamento para 1987.

Mas foi com a revisão constitucional de 1989 (aqui), e a modificação do n.º 2 do artigo 64.º da Constituição da República em que a expressão “... Serviço Nacional de Saúde, universal, geral e gratuito...” é substituída por “... Serviço Nacional de Saúde, universal e geral... tendencialmente gratuito” que as taxas moderadoras passam a poder ser aplicadas sem obstrução do Tribunal Constitucional. Mesmo assim chamado de novo o Tribunal Constitucional a pronunciar-se sobre a constitucionalidade da  nova Lei de Bases da Saúde de 1990 (Lei n.º 48/90, de 24 de agosto),aprovada pelo XI Governo Constitucional que previa na alínea c) da Base XXIV, entre as características essenciais do SNS, o “ser tendencialmente gratuito para os utentes, tendo em conta as condições económicas e sociais dos cidadãos”, sublinha no seu Acórdão 731/95 que a cobrança de taxas moderadoras será admissível, não sendo inconstitucional, desde que essas mesmas taxas tenham como finalidade a racionalização da utilização do SNS, que não correspondam ao pagamento do preço dos cuidados de saúde prestados e não criem impedimento ou restrição do acesso dos cidadãos económica e socialmente mais desfavorecidos aos cuidados de saúde.

Nos anos seguintes os sucessivos governos legislaram sobre o regime de taxas moderadoras no acesso à prestação de cuidados de saúde e atualizaram os preços a aplicar em 1992, 2003, 2004, 2004, 2006, 2007 e 2008, passando ainda a discutir o papel das taxas moderadoras como elemento financiador do Serviço Nacional de Saúde.

Criadas nos sistemas de saúde seguro-doença (aqui), na primeira década do século XX, as taxas moderadoras tinham como objetivo atuar do lado da procura, reduzir a procura desnecessária associada ao risco moral da gratuidade e ao efeito de terceiro pagador. No caso de Portugal em que o sistema se baseia no princípio consagrado na Constituição de garantir a todos os cidadãos o direito à saúde através de um Serviço Nacional de Saúde, fundado nos princípios da equidade as taxas moderadoras devem ter apenas um caráter extraordinário de dissuadir uma parte da procura desnecessária em particular nos serviços de urgência, mas nunca um carater de cofinanciamento do sistema.

Apesar deste preceito constitucional, o entendimento político recorrente ao longo dos últimos 20 anos, foi de aceitar que as taxas moderadoras constituem “receita do Serviço Nacional de Saúde”.

Foi assim que em 2006 o XVII Governo Constitucional, enquanto nomeava uma comissão para a estudar a sustentabilidade do financiamento do SNS, introduzia no Orçamento Geral do Estado de 2007 duas novas taxas moderadoras para acesso às prestações de saúde de internamento e de ato cirúrgico realizado em ambulatório. Comissão essa que em junho de 2017 veio a recomendar ao governo, entre outras medidas para a sustentabilidade financeira do SNS, a revisão do regime de isenções das taxas moderadoras baseada na capacidade de pagamento e de necessidade de continuidade de cuidados de saúde e a atualização das taxas moderadoras como medida de disciplina e de valorização dos serviços prestados.
Mas mais uma vez tal com tinha acontecido em 1987, perante o clima de contestação pública e parlamentar, é o próprio governo que decreta a revogação das “duas novas taxas moderadoras” em 2009 (aqui).

Com o despoletar da crise económica e financeira em 2008, Portugal viu-se obrigado a implementar um conjunto de medidas de austeridade durante os anos de 2009 e 2010 que vieram a culminar com a assinatura de um Memorando de Entendimento sobre as Condicionalidades de Política Económica (MoU) com a Troika para garantir o financiamento país. No que refere às taxas moderadoras o MoU impunha um aumento do valor das taxas moderadoras, o aditamento do pagamento de taxas moderadoras nas consultas de enfermagem, nas consultas não presenciais e nas sessões de hospital de dia, alterava o regime de isenções, estatuía procedimentos de cobrança e estabelecia a indexação automática à taxa da inflação divulgada pelo INE, relativa ao ano civil anterior (aqui).

Assim e ao longo do período de intervenção da Troika a receita das taxas moderadoras veio sempre a crescer, originado um aumento médio de mais de 100% no valor das taxas nas consultas e urgências e de 180% nos MCDT.

Com a mudança eleitoral verificada em 2016, entendeu o XXI Governo Constitucional reduzir os montantes a cobrar aos utentes, eliminar o pagamento de algumas taxas moderadoras, alargar o sistema de isenções aos dadores de sangue, aos dadores vivos de células, tecidos e órgãos e aos bombeiros, e os atendimentos de urgência, bem como os exames de diagnóstico aí realizados desde que referenciados pelos médicos de família, pelo centro de atendimento do SNS e pelo Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM).

Foi neste contexto de uma nova maioria política mais favorável à eliminação de algumas taxas moderadoras, que o Bloco de Esquerda apresentou no final da legislatura (2015-2019) uma proposta de lei que dispensa a cobrança de taxas moderadoras em duas circunstâncias: o atendimento, consulta e outras prestações de saúde no âmbito dos Centros de Saúde e consultas, atos complementares prescritos e outras prestações de saúde, se a origem de referenciação para estas for o Serviço nacional de Saúde, sustentada na convicção que num sistema tipo Serviço Nacional de Saúde, “As taxas moderadoras representam um obstáculo no acesso à prestação de cuidados de saúde por parte da população. Elas não moderam aquilo a que alguns chamam de procura desnecessária; elas são, isso sim, uma forma de copagamento…” (aqui)e nos resultados dos estudos da Nova, que apontam para uma perda de 243.755 consultas nos centros de saúde, 296.509 consultas num hospital do SNS e 165.692 exames de diagnóstico relacionadas com os custos das taxas moderadoras.

Aprovada na generalidade no passado dia 14 de junho com os votos a favor do PSD, do PS, do BE, do PCP, do PEV, do PAN, do deputado não inscrito Paulo Trigo Pereira e com os votos contra do CDS-PP, o projeto de lei acabou por baixar à Comissão de Saúde para ser discutido na especialidade, onde acabou por ser rejeitado com os votos do PSD, CDS e PS. (aqui)

Na Comissão de Saúde, o PS e o PSD apesar de manterem a sua concordância com a proposta aprovada argumentaram a favor de uma legislação que seja definida na próxima legislatura após a aprovação da Lei de Bases da Saúde. Defendendo o Governo através da ministra da saúde e do secretário de estado adjunto e da saúde que a futura Assembleia da República deve ter em conta que a receita gerada pelas taxas moderadoras representa 1.6% da despesa do SNS (160 milhões de euros em 2018) e cerca de ¼ do crescimento verificado no aumento da dotação financeira do Serviço Nacional de Saúde em 2019 (aqui).