No início dos anos 90, Merrill Singer,
investigador e professor de antropologia médica e saúde pública na Universidade
de Connecticut, introduziu o termo “syndemic” para referir-se ao conjunto de
problemas de saúde e sociais, que se influenciavam uns aos outros entre as
populações pobres dos centros urbanoss, afetadas pelo HIV/SIDA, a violência
e o abuso de substâncias (SAVA), definindo-o como: «… we have urged the use of the term “syndemic” to call attention to the synergistic nature of the health and social problems facing the poor and underserved» ou «we have introduced the term “syndemic” to refer to the set of synergistic or intertwined and muttualy
enhancing health and social problems faning the urban poor. Violence, substance abuse, AIDS, in this sense, are
not concurrent in that are not completely separable phenomena» (aqui).
Syndemic - Lancet Serie |
Ao longo dos anos o modelo “syndemic” foi-se
desenvolvendo, tendo a perspetiva “syndemic” sido utilizada pelo CDC dos
Estados Unidos (Centers for Disease Control and Prevention) na abordagem dos
principais problemas de saúde pública, tanto ao nível dos programas públicos
como da formação dos profissionais de saúde através da “Syndemics Prevention Network” criada para o efeito.
Tudo isto vem a propósito da publicação pela
Revista Lancet de 04 de março, de uma “Serie” dedicada ao modelo e à abordagem “Syndemic” (aqui),
explicando os importantes contrastes entre as abordagens convencionais baseadas
no conceito da multimorbilidade e a abordagem “syndemic” e explorando a forma
como o modelo “syndemic” pode ser utilizado para combater as desigualdades em
saúde e permitir aos clínicos a prática de uma medicina ancorada na compreensão
do contexto social e da interação deste com as doenças ou problemas de saúde,
indo para além da comorbilidade ou da multimorbilidade.
No conjunto de artigos agora publicados na “Syndemic
Serie” podemos perceber o conceito, a abordagem e o léxico do modelo “syndemic”
em particular nos artigos "Syndemics and the biosocial conception of health" e "Non-communicable disease syndemics: poverty, depression, and diabetes among low-income populations"
Como vimos anteriormente o primeiro conceito “syndemic”
identificado, e estudado, foi o SAVA, acrónimo em língua inglesa para
ocorrência de “ abuso de substâncias, violência e SIDA” em comunidades pobres e
desfavorecidas das zonas urbanas, com o tempo foi possível perceber que o
conceito “syndemic” não se limitava às doenças infeciosas mas se alargava às
doenças crónicas, ocorrendo por exemplo quando existem interações entre a
diabetes, a obesidade, problemas de saúde mental, a pobreza, a migração, a
discriminação, a exposição crónica ou aguda a traumas, incluindo a violência e as
condições socioeconómicas de privação.
Considerando os autores como critérios para “Syndemic”,
palavra não existente nos dicionários de língua portuguesa mas frequentemente
usada na literatura científica em português do Brasil como “sindemia” (aqui):
1.
Duas (ou mais) doenças ou condições de saúde que se
agrupam numa população específica;
2.
Fatores sociais ou contextuais criando condições
para agrupar duas (ou mais doenças) ou condições de saúde;
3.
Do agrupamento de doenças resultem interações
adversas de doenças ou condições de saúde, tanto a nível biológico, social ou
comportamental, aumentando a carga de doença das populações afetadas.
Syndemics and the biosocial conception of health |
A abordagem “sindémica” ao reconhecer como
esses fatores interagem mutuamente promovendo resultados adversos para a saúde,
permite ir muito mas além dos conceitos de multimorbilidade ou de doença
específica, quando é necessário explicar como é que as condições económicas e
sociais promovem e exacerbam este “cluster” de doenças, “Syndemics provide a
tool for empirically evaluating how health statuses of multi-morbidity arise in
a population, and what health interventions might be most effective for
mitigating them.”
Non-communicable disease syndemics: poverty, depression, and diabetes among low-income populations |
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