Em pouco mais de 4 meses o COVID-19 tornou-se na crise mais rápida
de saúde global conhecida até ao momento.
Várias características sistémicas, biológicas, políticas e de
saúde pública convergiram para que isso acontecesse: a sua contagiosidade e
letalidade populacional, a fragilidade de muitos sistemas de saúde nacionais e
uma fraca resposta dos dispositivos de saúde pública mundiais, a globalização
do transporte aéreo, a incapacidade para as elites mundiais ouvirem e atuarem
perante as advertências que há muito instituições e cientistas iam efetuando.(aqui)(aqui)
Embora ninguém pudesse prever exatamente quando e onde começaria,
que país ou que continente seria mais afetado há muito que sabíamos que isto
poderia acontecer, não foi por falta de avisos. Da conhecida e repetida citação
de Joshua Lederberg “The single biggest threat to man’s continued dominance on
the planet is the virus” ao artigo de Bill Gates no The New England Journal of
Medicine “The Next Epidemic — Lessons from Ebola” ou ao relatório de Setembro
de 2019 da Organização Mundial de Saúde “A world at risk: annual report onglobal preparedness for health emergencies” que previa a ocorrência de
epidemias ou pandemias devastadoras que causariam não só perdas de vidas mas
também destruiriam as economias e provocariam o caos social“ The world is at
acute risk for devastating regional or global disease epidemics or pandemics
that only cause loss of life but upend economies and create social chaos”, os
avisos estavam aí.
Mas se o vírus se espalhou com uma aparência democrática atingindo
de uma forma impensável o mundo rico e as classes sociais privilegiadas, desenganem-se
os que pensam que o COVID19 afeta de forma igual toda a população, não ele
antes exacerba as desigualdades sociais.
Bastaram algumas semanas para depararmos com alguns estudos ou
notícias que já evidenciam a repercussão desigual que a pandemia tem sobre os
mais pobres, seja na Índia onde o lockdown tem tido um efeito devastador sobre
a economia informal que abrange mais de 85% dos trabalhadores, obrigando
milhares de pessoas a abandonarem as grandes cidades e regressarem às suas
aldeias sem qualquer meio de subsistência(aqui), seja na cidade de Barcelona, onde os
bairros onde se concentra a população de menor rendimento, com piores condições
habitacionais, má saúde e uma esperança de vida menor (aqui) ou no Algarve onde a
população migrante oriunda da Índia, do Bangladesh, do Paquistão ou do Nepal, a
trabalhar na agricultura concentrou uma grande parte das cadeias de transmissão
em Faro, Tavira, Armação de Pera ou Albufeira (aqui)(aqui).
Vem tudo isto a propósito do trabalho conduzido pelos
investigadores da Escola Nacional de Saúde Pública no âmbito do Barómetro COVID-19, liderado por Carla Nunes, intitulado “Desigualdades, Diferenciação
Geográfica, Perceção Social” onde se evidenciam desigualdades na distribuição
dos casos de COVID19, verificando-se uma maior número de casos nos municípios
com maior desigualdade salarial, maior desemprego, menor rendimento e menor
poder de compra.
Terminamos com uma citação do artigo do professor Michael Marmot
na revista de Lancet de 2 de maio “Society and the slow burn of inequality”, a propósito da pandemia de COVID19 e o
aprofundar as desigualdades sociais.(aqui)
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