sexta-feira, 28 de julho de 2017

TAKEAWAYS E JUNK FOOD DOMINAM NAS ÁREAS MAIS POBRES E DEPRIMIDAS DE INGLATERRA

Na passada terça-feira, 25 de Julho, o jornal Guardian (aqui)dava a conhecer uma nova ferramenta de avaliação do meio ambiente alimentar – FEAT, desenvolvida pelo CEDAR, um dos cinco centros de excelência de investigação em saúde pública de Inglaterra, constituído através de uma parceria entre a Universidade de Cambridge, a Universidade de East Anglia e a Unidade de Investigação em Epidemiologia da Universidade de Cambridge, com o objetivo de investigar comportamentos alimentares e a atividade física.

Esta nova ferramenta permite conhecer a distribuição geográfica da rede de retalho alimentar de Inglaterra (Cafés, Lojas de conveniência, Restaurantes, Lojas especializadas, Supermercados, Takeaways) permitindo o seu relacionamento com as escolhas dietéticas, o peso corporal e a saúde das populações. A ferramenta permite aos profissionais de saúde pública, da saúde ambiental, às autoridades locais e nacionais o mapeamento, e, a monitorização do acesso das populações aos estabelecimentos de alimentação ao nível de um bairro, e a tomada de decisões de planeamento, tanto no que se refere à oferta e à implantação dos estabelecimentos, como à criação de evidências para o desenvolvimento de estratégias locais de saúde que favoreçam escolhas alimentares salutogénicas, e combatam quer a insegurança alimentar quer a obesidade.


De acordo com o trabalho do “inequality.project”, publicado no Guardian (aqui), verificou-se um aumento de 8% no número total de “takeaways” em Inglaterra nos últimos 3 anos, mais 4.000. De acordo com os dados disponibilizados pelo FEAST, os “takeaways” representam cerca de ¼ de todos os estabelecimentos alimentares do país concentrando-se nas áreas mais pobres e deprimidas de Inglaterra e confirmado a separação Norte-Sul de Inglaterra encontrada em outros estudos.(aqui)
Health Divides: Where You Live Can Kill - Clare Bambra

Das 30 áreas municipais onde se concentram as lojas de comida barata, que vendem principalmente “junk food” e refrigerantes, 25 estão nas áreas mais desfavorecidas do Norte e do Noroeste de Inglaterra.

Conhecida a associação entre a exposição aos estabelecimentos de comida rápida (aqui) que fornecem produtos ultraprocessados (aqui)(ricos em gordura, amidos, açúcar, aditivos e de elevado valor calórico), o aumento do consumo destes produtos e o crescimento da obesidade e da diabetes, muitos municípios tomaram decisões para restringir a instalação de lojas de comida rápida na ausência de uma política nacional.

Esta regulação e planeamento de novos takeaways de forma a proteger os consumidores, que de acordo com muitos dos estudos publicados (aqui) (aqui)subestimam o valor calórico das refeições das lojas de comida rápida, obriga os municípios a um difícil equilíbrio entre uma presença mais dinâmica do planeamento em saúde pública e as pressões orçamentais para autorizar das cadeias de comida rápida, de forma a melhorar os orçamentos municipais perante as políticas de cortes do governo nacional.


Sem uma compreensão clara por parte dos cidadãos para entender que quem governa os sistemas globais de alimentos são as empresas multinacionais de alimentos e bebidas, com enorme poder e concentração de mercado, será difícil para as autoridades nacionais romperem com este poder.(aqui)

sábado, 22 de julho de 2017

2017 - O CRESCIMENTO DA ESPERANÇA DE VIDA ESTAGNOU NO REINO UNIDO

No passado dia 17 de Julho o Professor Michael Marmot, diretor do Institute of Health Equity, apresentou os “Marmot Indicators 2017” dedicados à análise da esperança de vida entre 2012 – 2015 no Reino Unido. (aqui)

Os resultados apresentados mostraram uma desaceleração no aumento da esperança de vida, que nas palavras de Marmot levaram praticamente a uma paragem “the increase has more or less ground to a halt”, contrariando a tendência de crescimento contínuo, de 1 ano a cada 3 anos e meio nos homens e de 1 ano a cada 5 anos nas mulheres, verificada no Reino Unido ao longo do século XX.

Ao contrário do que tinha vindo a acontecer desde o final da II Guerra Mundial até 2010, com um crescimento contínuo da esperança de vida, passando de 64.1 anos para os homens e 68.7 para as mulheres em 1946, para 77.1 anos para os homens e 81.4 para as mulheres em 2005 e novamente para 78.7 anos para os homens e 82.6 para as mulheres em 2010, verificou-se um abrandamento se não mesmo uma paragem deste crescimento, desde que tomou posse em 2010 o governo de coligação (conservador-liberal) chefiado por David Cameron, uma vez que em 2015 a esperança de vida para os homens atingiu os 79.6 anos e os 83.1 anos para as mulheres.

Rise in life expectancy in England
Considerado como causa para alarme por Michael MarmotThere is cause for alarm. Something has happened to slow health improvement in the UK.”, uma vez que o Reino Unido ainda não atingiu os resultados obtidos pelos países nórdicos, pelo Japão ou por Hong-Kong onde a esperança de vida é maior e continua a aumentar, Marmot aponta para as desigualdades e para os determinantes sociais como causas para este abrandamento, já anteriormente verificados no estudo de Anne Case e Angus Deaton nos Estados da Unidos da América, onde se encontrou um aumento significativo na mortalidade entre os norte-americanos brancos não hispânicos dos 45 aos 54 anos (aqui) e os resultados obtidos pelo Glasgow Centre for Population Health, onde se encontrou um excesso de mortalidade na cidade de Glasgow, quando comparada com a verificada em cidades como Liverpool e Manchester (aqui).

No estudo agora apresentado, também se verificaram importantes desigualdades entre as regiões mais ricas e as mais pobres do Reino Unido, uma vez que enquanto no bairro mais rico de Londres, Kensington & Chelsea, os homens vivem até aos 83 e as mulheres até aos 86 anos, no Norte do Reino Unido em Blackpool, os homens vivem até aos 74 e em Manchester as mulheres vivem até aos 79 anos.

Para além destes resultados, confirmaram-se ainda profundas desigualdades entre a população de uma mesma área residencial, assim em Kensigton & Chelsea verificou-se uma diferença de 14 anos na esperança de vida entre as áreas mais ricas e mais pobres da área residencial. Em Kensington e Chelsea o rendimento médio é de 137.070 euros, mas a mediana é 36.441 euros, ou seja mais de metade das pessoas têm menos de 32.700 euros. Pelo que não será difícil adivinhar em que local de Kensigton & Chelsea se encontrava a Grenfell Tower (aqui).

Durante a apresentação foram ainda sublinhados os aspetos relacionados com a redução de rendimentos verificada entre 2008/9 e 2014/2015, e os cortes verificados nas áreas da saúde e social, que no caso do Reino Unido afetaram particularmente os mais velhos.

Apesar de Marmot ter resistido até agora a ligar a redução da esperança de vida à política de austeridade desenvolvida desde 2010, conclui que os cortes nas despesas públicas socias e de saúde, terão um importante impacto na qualidade de vida nos idosos e que é urgente continuar a estudar o impacto da austeridade na vida das pessoas.

What I would conclude, though, is that less generous spending on social care and health will have adverse impacts on quality of life of the elderly. It is urgent to determine whether austerity also shortens lives.


Com a apresentação dos “Marmot Indicators-2017” (aqui) foi aberto um importante debate no Reino Unido sobre o custo real da austeridade na vida das pessoas. (aqui)

sábado, 15 de julho de 2017

A IMPORTÂNCIA DAS RELAÇÕES SOCIAIS SOBRE A SAÚDE E A MORTE. TÁS A VER!

Num recente artigo do New York Times, intitulado “Social Interaction Is Critical for Mental and Physical Health” a jornalista Jane E. Brody, enfatizava a importância das relações sociais para aqueles que procuram um estilo de vida saudável, citando Emma Seppälä, diretora do Stanford University’s Center for Compassion and Altruism Research and Education, Brody afirma “para aqueles que procuram um estilo de vida que promova a saúde, não é suficiente comer só verduras e exercitarem-se regularmente”, “Don’t forget to connect.” (aqui)

Começando por citar o artigo de revisão de Umberson D e Montez JK, “Social Relationships and Health: A Flashpoint for Health Policy” (aqui) publicado em 2010, onde os autores revêm os resultados das interações sociais sobre os resultados em saúde, incluindo a saúde física, a saúde mental, os hábitos em saúde e a mortalidade, sublinhando que as pessoas que apresentam laços sociais mais fortes vivem mais, a jornalista cita ao longo do artigo um conjunto de estudos publicados ao longo de décadas que mostram que as relações sociais contribuem para a longevidade e para uma boa saúde.
El Roto - 6 OCT 2013 - El País
Num mundo globalizado dominado pelas políticas neoliberais, geradoras de profundas desigualdades e injustiças sociais, as pessoas sentem-se cada vez mais isoladas. Num mundo onde cada vez mais pessoas vivem sozinhas, em particular as mais velhas, e em que a organização do trabalho cada vez mais promove o isolamento social, a precarização e a desvinculação organizacional, numa sociedade em que a tecnologia ao invés de aumentar a interação social, antes contribui para o isolamento, vale a pena lembrar o trabalho de Berkman LF, Syme SL, iniciado nos anos 60, publicado em 1979, “Social networks, host resistance, and mortality: a nine-year follow-up study of Alameda County residents”, e o chamado “efeito Roseto”, efeito verificado na comunidade italo-americana da pequena localidade de Roseto na Pensilvânia, habitada por imigrantes italianos vindos da original Roseto Valfortore, na província de Foggia, Itália, por apresentar um reduzido número de mortes por doença cardiovascular em particular nos homens com menos de 55 anos, quando comparada com as comunidades vizinhas.

Em ambos os casos os investigadores encontraram uma relação positiva entre as interações sociais e a diminuição da mortalidade, no primeiro caso Berkman LF, Syme SL, estudaram a relação entre a mortalidade e os laços sociais e comunitários numa população de cerca de 6.000 pessoas do condado de Alameda (Califórnia), concluindo que as pessoas mais isoladas e com menos contactos sociais tiveram aproximadamente três vezes mais probabilidades de morrer do que as pessoas com laços sociais mais fortes, verificando-se que a associação entre os laços sociais era independente do estado de saúde auto-relatado, do ano da morte, do estatuto socioeconómico e do estilo de vida, tabagismo, consumo de bebidas alcoólicas, obesidade, e atividade física. No segundo caso na comunidade de Roseto, os investigadores Stewart Wolf e John Brown, encontraram na estrutura social da comunidade, a coesão e o suporte social que protegiam os habitantes de Roseto das doenças cardiovasculares.

Passados mais de 50 anos sobre a descoberta do “efeito de roseto”, a evidência científica publicada demonstra a importância das interações sociais sobre a saúde das comunidades, reconhecendo que a falta de interações sociais e a solidão agravam ou desenvolvem as doenças cardiovasculares, a saúde mental, os transtornos autoimunes, o cancro ou a cicatrização. Ao mesmo tempo que reconhece que o apoio emocional oferecido pelas interações sociais ajuda a reduzir os efeitos prejudicais do stress favorecendo e dando um sentido e um significado à vida.(aqui) (aqui) (aqui)

Terminamos como começámos, citando Emma Seppälä, diretora do Stanford University’s Center for Compassion and Altruism Research and Education, numa sociedade em que solidão e o isolamento está em crescimento, a boa notícia é:

Fear not! The good news is that social connection has more to do with your subjective feeling of connection than your number of friends. You could have 1,000 friends and still feel low in connection (thus the expression loneliness in a crowd) but you could also have no close friends or relatives but still feel very connected from within.” (aqui)

quinta-feira, 6 de julho de 2017

O ACORDO DE COMÉRCIO LIVRE ( NAFTA) É MAU PARA A SAÚDE PÚBLICA? O CASO DO CANADÁ E AS BEBIDAS AÇÚCARADAS

Na edição de 04 de Junho do Canadian Medical Association Journal (CMAJ), investigadores da Universidade de Oxford (Reino Unido), da London School of Hygiene & Tropical Medicine (Reino Unido), da Universidade de Stanford (Califórnia-EUA), e da Universidade de Bocconi, (Milão-Itália), publicaram um artigo onde abordam o impacto do acordo de comercio internacional, denominado North American Free Trade Agreement (NAFTA) - estabelecido entre os Estados Unidos da América, o México e o Canadá – no consumo de xarope de milho com alto teor em frutose, usado em produtos alimentares e refrigerantes, no Canadá.(aqui)

No estudo agora publicado, “Impact of the North American Free Trade Agreement on high-fructose corn syrup supply in Canada: a natural experiment using synthetic control methods”, os autores investigaram o efeito das alterações tarifárias introduzidas com a entrada em vigor do NAFTA, separando as tarifas dos produtos contendo xarope de milho com alto teor de frutose (HFCS) dos produtos contendo açúcares de cana sacarina e beterraba e a aplicação de uma tarifa reduzida ao xarope de milho (HFCS).
Canadian Medical Association Journal
De acordo com os resultados obtidos verificou-se um aumento do consumo diário de 41.6 Kcal per capita provenientes de edulcorantes, uma associação positiva deste consumo de HFCS com o crescimento da taxa de obesidade, passando de 5.6% para 14.8% e um aumento na prevalência de diabetes de 3,3% para 5,6%, de 1998/99 a 2008/09.

Perante estes factos, os autores avançaram com três explicações, em primeiro lugar, um mecanismo específico através do qual os acordos de comércio livre podem afetar a dieta da população: as tarifas de importação, demonstrando que uma pequena mudança pode determinar a dieta das pessoas, incluindo o consumo de HFCS, causando o aumento da obesidade e da diabetes, em segundo lugar, os investigadores salientaram a robustez dos métodos utilizados e as associações encontradas e em terceiro lugar a verificação de uma mudança no padrão de consumo de açúcares, com uma diminuição do consumo dos açúcares de beterraba e cana sacarina, um aumento do consumo de xarope de milho rico em frutose, e, uma interrupção da tendência de diminuição para o consumo total de açúcaresConfirmando as principais preocupações de muitos profissionais de saúde pública que mostraram sérias reservas sobre o efeito dos acordos de comércio livre para a saúde das populações, alertando para o seu potencial efeito negativo, uma vez que se centram na eliminação das barreiras ao comércio, tais como tarifas (sobre importações e exportações) ou cotas de importação para os países membros, provocando, como agora se verificou, o aumento do consumo de produtos prejudiciais para a saúde.
Lancet

As conclusões do estudo sublinham a crescente preocupação demonstrada na comunidade internacional com os efeitos dos acordos de comércio internacional, como o TTP, o TTIP, o CETA, (aqui)(aqui)sobre a saúde pública e chamam à atenção dos mais diversos atores sociais, sobre a ação dos “ determinantes comerciais da saúde” aqui definidos como “strategies and approaches used by the private sector to promote products and choices that are detrimental to health”. (aqui)