A batalha da administração Trump na última
Assembleia Mundial de Saúde, que decorreu em Genebra em maio passado, para que
na resolução WHA71.9 “Infant and young child feeding” (aqui) não constassem as frases
que incitavam os governos a proteger e a promover o aleitamento materno e a
restringir a promoção de produtos alimentares com efeitos negativos para as
crianças e jovens, favorecendo os interesses das grandes empresas de produtos
alimentares norte-americanas dirigidas às crianças e em particular às que fabricam
fórmulas para lactentes, é apenas um episódio de uma guerra mais vasta contra
os interesses públicos e a saúde pública mundial.
Desde há alguns meses que a administração
norte-americana tem vindo a tentar impor os interesses da indústria
farmacêutica dos Estados Unidos, atacando em particular as posições europeias.
Em Fevereiro o “Council of Economic Advisers” da Casa Branca (aqui) publicava um
documento onde afirmava que o controlo dos preços de produtos farmacêuticos
efetuado pela União Europeia “parasitava” os interesses dos contribuintes
americanos que geralmente pagam muito mais pelos medicamentos do que os
europeus. Em maio o presidente Trump declarava que a culpa dos preços elevados
dos medicamentos nos EUA, se devia em parte, ao fato de países estrangeiros
tirarem proveito da inovação americana (aqui).
Em julho o jornal independente indiano “The Wire” (aqui) dava nota da denúncia dos “Médicos Sem Fronteira” que acusavam a diplomacia norte-americana de bloquear as referências à importância de oferecer medicamentos contra a tuberculose a preços justos e acessíveis às populações dos países pobres na Declaração a ser aprovada na Assembleia Geral das Nações Unidas sobre Tuberculose que se realizará em 26 de setembro em Nova Iorque (aqui), invocando a necessidade de cumprir as regras da propriedade intelectual e impedindo qualquer menção ao acordo de Doha da Organização Mundial do Comércio conhecido como “ TRIPS Agreement and Public Health and the use of TRIPS flexibilities” um acordo sobre aspetos dos direitos de propriedade intelectual relacionados com o comércio que permite tornar medicamentos inovadores acessíveis nos países pobres.
Por outro lado, no meio de crescentes tensões
comerciais entre os Estados Unidos e a maior parte do mundo rico, a
administração Trump ameaçou retirar-se da Organização Mundial do Comércio (OMC)(aqui) e abandonar um conjunto de regras que permitem um conjunto especial de exceções
nos acordos de propriedade intelectual da OMC que permitem aos governos emitir
licenças compulsórias sobre patentes de empresas farmacêuticas (aqui)- no caso de uma
emergência de saúde pública nacional.
É impossível calcular quantas vidas seriam
perdidas em todo o mundo se os acordos exceção sobre medicamentos que encorajam
a fabricação de medicamentos genéricos por países de renda baixa e média desaparecessem.
No caso do VIH/SIDA, o fim da queda histórica que o preço dos medicamentos contra
o VIH tem sofrido (aqui) provocaria milhares de vidas perdidas, uma vez que uma subida
dos preços do seu valor atual de 75 dólares americanos por ano e por pessoa praticado
nos países de renda baixa para o custo de um tratamento típico equivalente nos
Estados Unidos de cerca de 3.600 dólares americanos por ano, resultaria na
perda de milhões de vidas perdidas apenas por razões económicas.
A ameaça à saúde global e à saúde pública
mundial, por parte da atual administração americana, é óbvia, o presidente Trump
foi claro em junho durante a cimeira dos G-7 e em julho durante a reunião da
NATO em Bruxelas, os Estados Unidos só permanecerão em organizações que sejam
claramente vantajosas para si, abandonando uma visão multilateral que
possibilitou progressos e vários triunfos na saúde global desde o início deste
século, fomentando posições nacionalistas e egocêntricas e pondo em causa o
funcionamento da Organização Mundial de Saúde, o Global Fund to Fight AIDS,Tuberculosis and Malaria, por problemas de financiamento resultantes das suas
posições políticas.
Sem comentários:
Enviar um comentário