quarta-feira, 28 de dezembro de 2016

NÃO PODE HAVER TURISMO DE QUALIDADE SEM EMPREGO DECENTE

Em Outubro de 2016, Portugal superou os 10 milhões de hóspedes estrangeiros, tendo as receitas turísticas chegado aos 11 mil milhões de euros, representando um crescimento de 10,3%, face ao registado em 2015 (aqui)(aqui) (aqui), tendo criado mais de 45.000 postos de trabalho até ao final do 3.º trimestre deste ano nos setores da Restauração e Bebidas e do Alojamento (aqui). Um resultado histórico que provavelmente confirmará o anúncio feito em setembro de 2016 pelo Ministro da Economia de que Portugal teria em 2016 “o melhor ano turístico de sempre”.(aqui)

Apesar dos resultados apresentados muitas trabalhadoras e trabalhadores do setor hoteleiro sofrem a precariedade laboral. Num setor que empregava em 2015 cerca de 57.000 trabalhadores, dos quais 54.000 a tempo completo, cerca de 31% dos que aí trabalham têm vínculos precários ou contratos a termo certo (aqui). De acordo com os dados do Sindicato dos Trabalhadores na Industria de Hotelaria, Turismo, Restaurantes e Similares do Sul nas unidades hoteleiras, encontra-se uma elevada percentagem de trabalhadores “não efetivos” ou seja, trabalhadores com contratos a termo, temporários, estagiários e em outras formas de contratação precária. “ No total dos empreendimentos turísticos em 2012, o trabalho precário, aproxima-se dos 30%, sendo mais acentuado nos hotéis de 5 estrelas onde essa percentagem atinge os 40% dos trabalhadores.”(aqui)
ilustração de "Las Kellys salen de la habitación para denunciar su explotación laboral" - Diagonal
Num setor em que a grande maioria destes trabalhadores, são invisíveis, o trabalho das empregadas de andares é ainda mais invisível. Mas não se pense que este um problema laboral exclusivamente português, ele atinge a grande maioria dos países da União Europeia a 28, e em particular as principais regiões turísticas como Espanha, onde esta situação tem sido motivo de investigação e de denúncias quer por parte das organizações sindicais, quer por parte dos coletivos de empregadas de andar, conhecidas em Espanha como Kellys “ las que limpian”.(aqui)(aqui)

Num trabalho recente de Ernest Cañada, publicado em livro na editorial Icaria “Las que limpian los hoteles“ (aqui), o investigador parte do testemunho de 26 empregadas de quarto (aqui)para pôr a nu a precarização dos contratos, o aumento da carga de trabalho, a desprofissionalização do trabalho e os problemas de saúde a que estão sujeitas. Apesar da dureza e da invisibilidade do trabalho, este trabalho foi executado durante muito tempo por trabalhadoras qualificadas, contratadas a tempo completo e apoiadas nas suas tarefas por outro pessoal (carregadores e pessoal de armazém), mas com o despoletar da crise de 2008, cresceu a externalização, a desqualificação profissional, o aumento às vezes subtil da carga de trabalho com a eliminação sucessiva da figura de carregadores/pessoal de armazém, aumentando o número de habitações a cargo, a supervisão dos estagiários e das trabalhadoras contratadas através das empresas fornecedoras de trabalho temporário. À medida que aumenta a externalização, cresce a instabilidade profissional, não se estabelece nem vínculo com a profissão nem com o local de trabalho, generaliza-se o medo com a perda do posto de trabalho, e criam-se condições para uma diminuição da organização sindical e a aceitação de baixos salários.

No que se refere à saúde, aos comuns problemas músculo-esqueléticos (lombalgias, síndromes canais cárpicos, tendinites), somam-se os problemas de saúde físicos e mentais, determinados pela ansiedade, pelo stress, pelo baixo controlo do trabalho, insegurança no trabalho, gerando comportamentos não saudáveis. (aqui)


Neste final de ano em que muitos, optam por umas pequenas férias ou por uma festa de fim de ano numa qualquer unidade hoteleira, lembre-se que NÃO PODE HAVER TURISMO DE QUALIDADE SEM EMPREGO DECENTE.

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