Ignorar as
condições sociais de um doente pode ser um erro inadmissível, considerando que
o seu prognóstico, se não mesmo as suas próprias etiologias, e as opções
terapêuticas podem ser fortemente influenciadas por ele. Curar clinicamente um
doente, ou estabilizá-lo e enviá-lo de novo para o seu ambiente deve ter como
pano de fundo as palavras de Leonard Slyme, recordadas por Michael Marmot, “Just because you’re a doctor, doesn’t mean
you understand the causes of ill health. You understand something about biology and medical conditions but you’ve
got to learn something about society if you really want to understand the
causes of ill health.” (aqui)
O VIH-SIDA
é um reflexo claro disso. Apesar do mundo ter sido capaz de deter a epidemia e
reverter a propagação da epidemia, conseguindo que as novas infeções pelo VIH e
as mortes por SIDA tenham diminuído muito desde o ponto mais elevado da
epidemia, em Junho de 2016 viviam 36,7 milhões com VIH, das quais apenas 18,2
milhões (mais 3 milhões do que em 2014) tinham acesso a medicamentos capazes de
salvar as suas vidas. Apesar dos progressos realizados o último relatório da
UNAIDS, chama à atenção para a situação na África subsariana onde as mulheres
enfrentam uma triple ameaça, uma vez que para além de correrem risco elevado de
infeção, têm baixas taxas de deteção do vírus e uma pobre adesão ao tratamento. (aqui)
Também nos
países de renda média e alta o VIH continua a afetar os mais desfavorecidos, os
toxicodepentes, os presos, os desempregados e os migrantes. Os novos
tratamentos travarão a transmissão do VIH e salvarão vidas, mas devolverão as
pessoas ao seu ambiente social, e não serão por si sinónimo de melhoria das
suas vidas. Devolvidos à rua, ou aos bairros degradados, com baixa escolaridade,
sem trabalho, sem apoio familiar e social, sem dentes, acumulando doenças
respiratórias, hepatite C, ou problemas de saúde mental, facilmente recairão. (aqui)(aqui)
A
epidemia pode desaparecer mas as pessoas continuarão a ficar prisoneiras no
ciclo de saúde-doença se não trabalharmos na causa das causas, os determinantes
sociais da saúde.
Como escreveu Virchow (citado por Geoffrey Rose) “Epidemics
appear, and often disappear without traces, when a new culture period has
started; thus with leprosy, and the English sweat. The history of epidemics is
therefore the history of disturbances of human culture”.(aqui)
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