quarta-feira, 27 de setembro de 2017

A FOME NO MUNDO AUMENTOU PELA PRIMEIRA VEZ DESDE O INÍCIO DO SÉCULO

No passado dia 15 de Setembro a FAO – Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura, apresentou na cidade de Roma o Relatório “O estado da segurança alimentar e nutrição no mundo em 2017”, que revelou uma inversão da diminuição da fome no Mundo.

Pela primeira vez desde o final do século XX o número de pessoas com fome no mundo aumentou. De acordo com o documento agora publicado verificou-se um crescimento de 11% no número de pessoas que sofrem de fome, contrariando a descida consistente verificada nos últimos 10 anos, e fortemente correlacionado com o aumento da conflitualidade violenta verificada desde 2005 (ano em que foi atingido um mínimo histórico) e em particular desde 2010.
Com o crescimento e a ampliação de conflitos violentos no Próximo Oriente, na África do Norte, na África Subsaariana, na América Central e na Europa Oriental, em particular na Ucrânia, milhões de pessoas foram forçadas à deslocação, motor principal da insegurança alimentar e da desnutrição, provocando impactos negativos na produção e na disponibilidade de alimentos, em particular nas comunidades rurais. A título de exemplo, no caso da guerra civil que tem assolado a Síria, mais de 11 milhões de pessoas tiveram de fugir das suas casas, 6 milhões para outros locais do país e outros 5 milhões para os países vizinhos, provocando insegurança alimentar quer na população deslocada, quer na população de acolhimento. De acordo com os dados revelados pela FAO as pessoas deslocadas passam em média mais de 17 anos em campos de refugiados ou em campos de acolhimento.

A par do aumento de pessoas que sofrem de fome crónica, tem também crescido o número de pessoas subalimentadas, estimando-se que este número tenha aumentado de 777 milhões em 2015 para 815 milhões de pessoas em 2016, proporção ainda mais elevada nas crianças, uma vez que cerca de 75% das crianças subalimentadas com menos de 5 anos vivem em países afetados por conflitos, uma diferença de mais nove pontos percentuais em relação aos países que não estão envolvidos em guerras.

Para além das situações de conflito que tem agravado a situação de insegurança alimentar, várias regiões do mundo foram assoladas por fenómenos climatéricos relacionadas com o fenómeno El Niño.

Num mundo onde se produzem alimentos mais que suficientes para satisfazer as necessidades nutricionais da população, a segurança alimentar requere um enfoque nos rendimentos dos pequenos produtores, na resiliência dos sistemas de produção de alimentos, e a utilização sustentável da biodiversidade e dos recursos genéticos, de forma a enfrentar o objetivo 2 da "Agenda 2030 para o desenvolvimento sustentável!, “Acabar com a fome, alcançar a segurança alimentar e melhoria da nutrição e promover a agricultura sustentável”. (aqui)

sábado, 23 de setembro de 2017

SAÚDE E CINEMA - " A FÁBRICA DE NADA"

Estreou ontem em 5 cidades portuguesas o filme português “Fábrica de Nada”,  dirigido por Pedro Pinho,  que conta a história de um grupo de operários  em luta pelo  seus postos de trabalho e pela sua dignidade numa sociedade “de sentido único” onde o conformismo,  o individualismo, a alienação e  o “não há nada a fazer”,  se sobrepõem aos princpíos e os valores,  “Uma noite um grupo de operários percebe que a administração está a roubar máquinas e matérias- primas da sua própria fábrica. Ao decidirem organizar-se para proteger os equipamentos e impedir o deslocamento da produção, os trabalhadores são forçados - como forma de retaliação - a permanecer nos seus postos sem nada que fazer enquanto prosseguem as negociações para os despedimentos. A pressão leva ao colapso geral dos trabalhadores, enquanto o mundo à sua volta parece ruir.” (aqui)

Bem recebido pela crítica internacional, depois de ter estreado no passado mês de maio no Festival de Cannes, onde  recebeu o prémio FIPRESCI da Federação Internacional de Críticos de Cinema na Quinzena dos Realizadores (na  história da Quinzena dos Realizadores de Cannes, Pedro Pinho foi o segundo cineasta português a receber o prémio da crítica, depois de Manoel de Oliveira, em 1997, com “Viagem ao Princípio do Mundo”,  a “Fábrica do Nada”  recebeu ainda o Prémio de Melhor Realização na 5.ª edição do Duhok International Film Festival, no Iraque,  o Grande Prémio do Júri no CineFest Miskolc Internacional Film Festival, na Hungria e o Cine Vision do Festival de Cinema de Munique. (aqui)(aqui)


Com quase 3 horas de duração,  a “Fábrica do Nada”  é um raro momento de cinema para falar dos de “baixo”, dos invisiveís,  de “Quem construiu Tebas de sete portas”, e é para além disso um grande filme português (aqui) (aqui), a NÃO PERDER.

Quem construiu Tebas de sete portas?

Quem construiu Tebas de sete portas?
Nos livros estão os nomes dos reis.
Foram os reis que arrastaram os blocos de pedra?
E as várias vezes destruída Babilónia —
Quem é que tantas vezes a reconstruiu?
Em que casas da Lima fulgente
de oiro moraram os construtores?
Para onde foram os pedreiros na noite em que ficou pronta
a Mu­ralha da China? A grande Roma
está cheia de arcos de triunfo. Quem os levantou?
Sobre quem triunfaram os césares?
Tinha a tão cantada Bizâncio
Só palácios para os seus habitantes?
Mesmo na lendária Atlântida
Na noite em que o mar a engoliu bramavam os
afogados pelos seus escravos.
O jovem Alexandre conquistou a Índia.
Ele sozinho?
César bateu os Gálios.
Não teria consigo um cozinheiro ao menos?
Filipe da Espanha chorou, quando a armada se afundou.
Não chorou mais ninguém?
Frederico II venceu na Guerra dos Sete Anos —
Quem venceu além dele?
Cada página uma vitória.
Quem cozinhou o banquete da vitória?
Cada dez anos um Grande Homem.
Quem pagou as despesas?
Tantos relatos
Tantas perguntas.
                                         Bertold Brecht
(Tradução de Paulo Quintela)


sexta-feira, 15 de setembro de 2017

NO 38.º ANIVERSÁRIO DO SNS - GLOBAL BURDEN DISEASE 2016 RECONHECE PORTUGAL COMO UM DOS PAÍSES ONDE A ESPERANÇA DE VIDA MAIS CRESCEU.

38 Anos passados sobre a fundação do Serviço Nacional de Saúde no dia 15 de Setembro de 1979, a edição online da revista Lancet de hoje publicava o estudo “Global Burden of Diseases, Injuries, and Risk Factors Study 2016 (GBD 2016)abrangendo o período de 1990 a 2016, onde Portugal se destaca como um dos países exemplo, uma vez que apresenta uma esperança de vida à nascença mais elevada do que a que seria esperada atendendo ao seu nível de desenvolvimento sociodemográfico, confirmando os enormes progressos verificados nos últimos 40 anos, resultantes das profundas mudanças verificadas após a Revolução de Abril de 1974, alicerçadas nas melhorias do saneamento básico, na universalização dos cuidados de saúde e na criação do Serviço Nacional de Saúde.
De acordo com o estudo agora publicado verificou-se em 2016 pela primeira vez, que o número estimado de óbitos em crianças com menos de 5 anos caiu se cifrou abaixo de 5 milhões, registando-se apenas 230 mil mortes maternas. No que se refere às mortes por doenças transmissíveis verificou-se uma diminuição da mortalidade (com exceção do dengue), estimando-se 1.03 milões de mortes por VIH/SIDA, 1.2 milhões de mortes por Tuberculose e 719.600 por malária.

72,3% (39,5 milhões) de todas as mortes em 2016 eram provocadas por doenças não transmissíveis, tendo a mortalidade por doença isquémica cardíaca aumentado 19% e a mortalidade por diabetes cerca de 31,1% desde 2006. Verificou-se ainda um aumento significativo na mortalidade decorrente de conflitos bélicos e de terrorismo. As mortes causadas por armas de fogo foram causa mais importante de violência interpessoal.

Entre os principais fatores de carga de doença, encontram-se as infeções respiratórias inferiores, a diarreia, o parto prematuro, o VIH/SIDA e a malária, e entre os principais fatores de risco para a saúde, os níveis de obesidade, tabagismo e a má alimentação .

Apesar dos progressos realizados uma tríada de problemas; a obesidade, os conflitos bélicos como os que se tem vivido na Síria, no Iémen, no Sudão do Sul ou na Líbia, e a doença mental têm impedido melhores resultados, contribuindo para uma perda de vida saudável.

Finalmente e de acordo com o estudo agora publicado as principais problemas de saúde que no de 2016 fizeram as pessoas sentirem-se doentes foram: a dor lombar baixa, as dores de cabeça/enxaqueca, a anemia por deficiência de ferro e a depressão.

15 Setembro de 1979  – Uma maioria parlamentar constituída pelos deputados do Partido Socialista (PS), do Partido Comunista (PCP), da União Democrática e Popular (UDP) e pelo deputado independente Brás Pinto aprovavam a Lei de Bases do Serviço Nacional de Saúde concretizando o artigo 64.º da Constituição da República Portuguesa, contando com a oposição dos partidos de direita e do centro direita e do Bastonário da Ordem dos Médicos (Gentil Martins) hoje considerado como a “joia da coroa da democracia portuguesa”.

segunda-feira, 11 de setembro de 2017

11 SETEMBRO 1973 - ALLENDE UM HOMEM À FRENTE DO SEU TEMPO

“La historia es nuestra y la hacen los pueblos”

Neste dia 11 de Setembro vale a pena lembrar, Salvador Allende, uma das grandes figuras da medicina social, a par de Rudolf Virchow ou de Friedrich Engels, influenciado por Max Westenhofer, patologista alemão discípulo de Rudolf Virchow, que durante anos dirigiu o departamento de patologia da Escola Médica da Universidade do Chile, incentivando os seus alunos a conhecerem a visão de Virchow acerca das determinantes sociais das doenças.

Um humanista que durante toda a sua vida lutou por uma sociedade mais justa, mais equitativa e solidária, desempenhando múltiplos papéis. Foi professor das Escolas Noturnas para Operários ainda estudante de medicina, médico influente, dirigiu o Colégio Médico do Chile de 1949 a 1963, contribuindo ao longo desses anos para a expansão da saúde pública, para o lançamento do serviço nacional de saúde (1952),  e ajudando a fundar a Revista “ Cuadernos Médicos Sociales “ em 1959, que ainda hoje se publica. (aqui)

Cidadão comprometido com a vida pública, foi fundador e dirigente do Partido Socialista do Chile, ministro da “ Salubridad, Previsión y Asistencia Social” entre 1939 – 1942, Senador da República Chilena de 1945 – 1970, e candidato derrotado à Presidência da República em 1952, 1958 e 1964.

Eleito em 4 de setembro de 1970 como Presidente da República, exerceu o cargo até ao dia 11 de setembro de 1973. Nesse em dia, o dia em que deflagrou o Golpe de Estado militar liderado por Augusrto Pinochet(que iria durar 17 anos) pôs fim à sua vida. (aqui) (aqui)(aqui)

Citando o Professor Howard Waitzkin da Universidade do Novo México “ Many years later, the insight that the social origins of illness demand social solutions is not particularly surprising. Like Engels and Virchow before him, Allende saw major origins of illness in the structure of society. This vision implied that medical intervention without political activism would remain ineffectual and, in a deep sense, misguided.” (aqui)

sábado, 2 de setembro de 2017

MAIS EDUCAÇÃO, MENOS ENFARTES

Num estudo publicado, recentemente (30-08), na revista British Medical Journal, " Education and coronary heart disease: mendelian randomisation studyum grupo de investigadores da Universidade de Lausanne, da Universidade de Oxford e da Universidade College London liderado por Taavi Tillamn, do departamento de epidemiologia e saúde pública do University College de Londres, procuraram perceber se existe suporte genético para sustentar que a educação é um fator de risco causal para o desenvolvimento de doença cardiovascular, e em caso afirmativo, se a educação causa mudanças nos fatores de risco cardiovascular que podiam ser seus mediadores.

No estudo os autores procederam a um estudo de randomização mendeliana, usando dados genéticos como proxy para a educação, partindo de dados genéticos de dois grandes agrupamentos de estudos(CARDIoGRAMplusC4D e SSGAC) que incluiram 112 estudos de países de renda alta, abrangendo 540.000 pessoas da Europa e dos Estados Unidos.

Os autores concluiram que o estudo de randomização mendeliana encontrou suporte genético para suportar a hipótese de que o prolongamento dos anos de estudo está associado a um menor risco de doença coronária, revelando que o alargamento de 3.6 anos do processo educativo levará a uma redução de 27% no risco de de padecer de doença coronária.

Apesar de os determinantes genéticos que incidem sobre a predisposição para completar mais anos de educação, só explicarem 3% do rendimento escolar o estudo demonstra que aumento do número de anos escolaridade reduz o risco de vir a desenvolver uma doença coronária, confirmando o papel da educação como determinante social da saúde.

Ver ainda:
Epigenética e Saúde Pública (aqui)
O local onde nascemos pode mudar o nosso código genético? (aqui)
Residential environments” e os fatores de risco cardiovascular. (aqui)

Social determinants of health: the solid facts. (aqui)