domingo, 18 de agosto de 2019

IMPACTO DAS ILHAS DE CALOR URBANO NA SAÚDE HUMANA - DESIGUALDADES E DETERMINANTES SOCIAIS


No passado dia 8 de agosto, o New York Times publicava o artigo “Summer in the City Is Hot, but Some Neighborhoods Suffer More” abrindo as suas páginas aos trabalhos do Professor Vivek Shandas da Escola de Planeamento e Estudos Urbanos da Universidade de Portland, sobre o mapeamento dos efeitos das ilhas de calor em algumas das cidades dos Estados Unidos e as suas consequências sobre os seus habitantes.

No trabalho liderado pelo professor Shandas, os investigadores identificaram os principais “pontos quentes” urbanos e o seu potencial de risco sobre a saúde das pessoas, uma vez que o efeito “ilha de calor” é caraterizado por temperaturas, em média, superiores às que se verificariam em zonas rurais e com coberto vegetal natural. Testaram variáveis ​​sociodemográficas e físicas dos bairros, incluindo o rendimento, o nível de escolaridade, a densidade populacional e os espaços verdes, concluindo que os moradores mais pobres se concentram nas áreas urbanas com maior índice de construção e menos espaços verdes (aqui)(aqui).
Ilhas Urbanas de calor
Os resultados encontrados confirmam as evidências científicas publicadas desde que Klinenberg estudou a Onda de Calor que afetou Chicago em 1995 concluindo que as 700 mortes que aí ocorreram não eram consequência “natural” da Onda de Calor mas foram antes causadas pelo contexto e pela organização social humana.

Também no nosso país (aqui), tem sido dados alguns passos para um melhor conhecimento dos efeitos das “ilhas de calor” ou “ilhas urbanas”, tendo recentemente sido dado a conhecer os resultados preliminares do estudo “Cartografia da vulnerabilidade térmica: mapeamento dos efeitos das ondas de calor em Lisboa, face às projeções climáticas”, da iniciativa da Câmara Municipal de Lisboa e executado pelo Instituto de Ambiente e Desenvolvimento da Universidade de Aveiro em parceria com a Agência de Energia e Ambiente de Lisboa (Lisboa E-Nova), o Instituto de Geografia e Ordenamento do Território (IGOT) e o Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA).
Diferenças térmicas na cidade de Lisboa
O estudo, que ainda decorre, procura prever o efeito cumulativo das ondas de calor, cada vez mais frequentes e prolongadas em contexto de alterações climáticas e da chamada “ilha de calor” que é tanto mais expressiva quanto mais densamente construídos e menos verdes são os aglomerados urbanos. Recordamos que em agosto de 2017 a revista Lancet Planetary Health, publicava o estudo “Increasing risk over time of weather-related hazards to the European population: a data-driven prognostic study” onde se concluía que o aquecimento global poderá provocar na Europa catástrofes relacionadas com o clima que afetarão cerca de 2/3 da população no ano de 2100 e multiplicarão por 50 as mortes verificadas no período de 1981-2100, prevendo-se que no Sul da Europa, a taxa de mortalidade prematura devido ao clima extremo para os anos em estudo (2071-2100) possa atingir cerca de 700 mortes anuais por milhão de habitantes tornando-se no maior fator de risco ambiental para a saúde.

De acordo os resultados preliminares apresentados pela Universidade de Aveiro em julho deste ano verifica-se que nas zonas mais densamente construídas, ilhas urbanas, as temperaturas possam ser superiores de 4 a 6 graus em relação a zonas rurais da mesma região. São as zonas da cidade de Lisboa, como o aeroporto, a Baixa e uma faixa contígua com essa que se prolonga pela margem do Tejo em direção a poente, as que registam uma diferença de temperatura mais significativa em relação a zonas rurais se não houvesse cidade naquela área.

Num mundo cada vez mais quente, e em sociedades cada vez «mais frias» que voltam as costas aos mais vulneráveis, o calor é um assassino invisível, que não liquida todos por igual. A história das ondas de calor ou ilhas urbanas é uma história económica e social, só compreendida à luz dos determinantes sociais da saúde.