Este ano
cumpre-se o 30.º aniversário da primeira Conferência Internacional sobre
Promoção da Saúde, realizada em Ottawa em 21 de Novembro de 1986 (aqui), sob a égide
da Organização Mundial de Saúde e do seu secretário-geral Halfdan Mahler, dando
continuidade à agenda da 29.ª Assembleia Mundial de Saúde, de 1976 e à
Conferência de Alma-Ata de 1979, onde foram introduzidas as ideias de cuidados
de saúde primários e de “ Saúde para Todos no Ano 2000” (aqui).
No Canadá
em 1986, foi aprovada a chamada Carta de Ottawa, considerada hoje por muitos
como o “gold standard” da promoção da saúde. A declaração de Ottawa providenciou
uma definição positiva de saúde (algo a alcançar, ao contrário de algo a ser evitado)
e encorajou uma abordagem cooperativa para a promoção da saúde que procura
promover a saúde através de mudanças nos determinantes socias da saúde.
A Carta de
Ottawa delimitou três estratégias para a promoção da saúde: advogar, capacitar
e mediar. Estratégias que deveriam ser aplicadas em 5 áreas de ação: construir políticas
saudáveis; criar ambientes favoráveis; reforçar a ação comunitária; desenvolver
competências pessoais e reorientar os serviços de saúde em direção ao futuro e
para além do setor da saúde.
Apesar de
ter decorrido numa época de viragem na cena internacional, com a implementação
das políticas de ajustamento neoliberais iniciadas nos anos 80 levando ao
início de uma nova era em que a economia tomou conta das políticas sociais “ primacy of economic over social policies (often referred to as neoliberalism), charity versus entitlements, and concepts of liberty”, a Carta de Ottawa introduziu 4
grandes áreas de inovação: a definição positiva de saúde orientada para a
promoção de saúde, e para a ação no sentido de melhorar as condições de vida das
pessoas e a equidade em saúde; a saúde como um produto da vida para o qual são
necessários pré-requisitos (paz, abrigo, educação, alimentação, recursos
económicos, ecossistema estável, recursos sustentáveis, justiça social e equidade);
proposição de valores e princípios fundamentais que conduzem à saúde
(participação, capacitação, equidade, holismo, abordagem intersectorial,
estratégias múltiplas).
30 Anos
passados, e no ano em que decorrem múltiplos eventos para celebrar a Carta de
Ottawa(aqui) (aqui) (aqui) (aqui), importa discutir a promoção da saúde enquanto processo de empoderamento
das pessoas, tanto a nível individual como coletivo, para puderem ter mais
controlo sobre as suas vidas, à luz das mudanças ocorridas nas últimas 3
décadas.
Nas últimas
décadas o mundo foi marcado por profundas alterações económicas e sociais,
marcadas pela globalização, pela liberalização dos mercados financeiros e dos
fluxos internacionais do capital (controlo da inflação, credito barato,
“financeirização”), com um aumento do poder das empresas e uma concentração do
poder económico privado. De acordo
com o relatório “The political origins of health inequity: prospects for change”
da Comissão Lancet - Universidade de Oslo sobre a Governança Global de Saúde intitulado , «
With globalisation, health inequity increasingly results from transnational activities that involve actors with different interests and degrees of power:states, transnational corporations, civil society, and others. The decisions, policies, and actions of such actors are, in turn, founded on global social norms. Their actions are not designed to harm health, but can have negatives hide effects that create health inequities. The norms, policies, and practicesthat arise from global political interaction across all sectors that affect health are what we call global political determinants of Health».
Estas
mudanças obrigam a que a capacitação, das pessoas e das comunidades, tenham de
ter em conta quer os determinantes sociais da saúde, e aquilo que Ilona Kickbusch chama “os determinantes políticos da saúde”.
Nas
palavras de Ilona Kickbush, no Editorial do BMJ de janeiro de 2015,(aqui)a Saúde é uma escolha política e “… and politics is
a continuous struggle for power among competing interests. Looking at health through the lens of political
determinants means analysing how different power constellations, institutions,
processes, interests, and ideological positions affect health within different
political systems and cultures and at different levels of governance”. De acordo
com Clare Bambra (aqui)a saúde é política « Health, like almost all other aspects of
human life, is political in numerous ways» por três principais razões: “ ●
Health is political because, like any other resource or commodity under a
neo-liberal economic system, some social groups have more of it than others; ●
Health is political because its social determinants are amenable to political
interventions and are thereby dependent on political action (or more usually,
inaction); ● Health is political because the right to ‘a standard of living adequate
for health and wellbeing (United Nations, 1948) is, or should be, an aspect of
citizenship and a human right.”
O
aparecimento destes novos desafios para o campo da promoção da saúde não rejeita
a importância da Carta de Ottawa. Pelo contrário, ela continua a confirmar a sua
visão, a orientação para ação e os valores da promoção da saúde nos dias de
hoje.
Os desafios
para avançar com a agenda da promoção da saúde devem ter em conta os aspetos
atrás realçados, uma vez que a falta poder, de influência e de controlo dos
cidadãos e das comunidades sobre as suas vidas geram uma das principais causas de
morte e de doença, a falta de EMPODERAMENTO.
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