domingo, 18 de setembro de 2016

GLOBALIZAÇÃO, DESIGUALDADES, CLASSES MÉDIAS, GANHADORES E PERDEDORES

Durante o primeiro semestre de 2016, foram publicados dois documentos que trouxeram dados novos para a discussão da pobreza no mundo. Em Fevereiro de 2016 o Stanford Center on Poverty and Inequality publicou o seu relatório anual “The Poverty and Inequality Report” (aqui)onde se conclui que os Estados Unidos da América são o país com os maiores índices de pobreza e de desigualdade, quando comparados com outros 09 países desenvolvidos e em Abril, Branko Milanovic publicou o seu livro “Global Inequality: A New Approach for the Age of Globalization” (aqui) que aporta novos dados que apontam para a redução das desigualdades entre países ricos e pobres, por via do crescimento de países, como a China e a Índia, aproximando o mundo da situação vivida por volta de 1820, quando a principal fonte de desigualdade era a origem social (classe) em vez da localização geográfica. De acordo com os dados publicados, enquanto nos países do Sul da Ásia as classes médias da China e da índia viram os seus rendimentos aumentar, nos países ricos as classes médias viram os seus rendimentos reduzidos ao mesmo tempo que a riqueza se concentrava nos 1% mais ricos
The Poverty and Inequality Report
Branko Milanovic propõe como explicação para esta situação, a globalização, o deslocamento do trabalho e a revolução digital. Numa entrevista ao “Estadão” Branko Milanovic (aqui)explica ao jornalista que o questiona: “ P - Por que não se deve separar globalização e tecnologia para aferir seus efeitos na desigualdade? R - Olhe à nossa volta e veja quantos exemplos de avanço tecnológico: tablet, computador, smartphones. Esses aparelhos nos tornam mais produtivos mas, para produzi-los, é necessário mão-de-obra barata, essencialmente asiática. Assim, o progresso tecnológico precisou da globalização para ser incorporado nos aparelhos. E, se não pudessem ser fabricados com mão- de-obra-barata, seu smartphone não teria aplicativos como o Uber. O número de pessoas que poderiam pagar por um iPhone fabricado na Suécia seria tão baixo que o Uber não teria razão de existir” e mais à frente referindo-se ao conceito de scalable job explicitado por Nassim Taleb no livro “Cisne Negro” «scalable jobs are those where a person´s same unit of labour can be solde many times over” responde “ P - Qual a relação da desigualdade com o trabalho em escala hoje? R - O chamado scalable job ocorre quando você pode vender a mesma unidade de trabalho inúmeras vezes. Quando faço uma palestra e ela é colocada à venda online, eu não continuo a proferir a palestra, só a ser remunerado por ela. De novo, a tecnologia e a globalização caminhando juntas para fazer com que mais ocupações sejam beneficiadas por escala. E isso leva a uma forte concentração de renda. O público global vai querer assistir só ao vídeo do tenista número um do ranking mundial. A Metropolitan Opera de Nova Iorque transmite seus concertos ao vivo para o mundo em salas de cinema. Como pode uma companhia de ópera regional competir com isso?
Global Inequality: A New Approach for the Age of Globalization
Mas ao mesmo tempo que diminuem as desigualdades entre países ricos e pobres, os dados das Nações Unidas, mostram que mais de 836 milhões de pessoas ainda vivem em pobreza extrema, que 1 em cada 5 vivem em regiões em desenvolvimento com menos de 1.25 dólares americanos (€1.12) concentrando-se a sua maioria no Sul da Ásia e na África Subsariana, acrescentando que a pobreza não afeta apenas os países de renda baixa, uma vez que os países de renda média como a China, a Indonésia, a Nigéria ou a Índia concentram metade dos pobres do mundo e que nos países desenvolvidos existem 30 milhões que crescem pobres nos países mais ricos do mundo.
Pobreza que não é apenas a falta de rendimento e de recursos para assegurar uma subsistência sustentável, mas tem antes uma natureza multidimensional que fez com que as Nações Unidas criasse o Índice de Pobreza Multidimensional (IPM), publicado pela primeira vez em 2010.

O índice identifica carências em três dimensões do Índice de Desenvolvimento Humano, mostra o número de pessoas que são multidimensionalmente pobres (33% dos que apresentam carências em ou mais dos indicadores ponderados) e o número de privações com a qual as famílias pobres têm de lidar.

Assim e de acordo com os resultados obtidos através da aplicação do IPM, 29% da população mundial vive em pobreza multidimensional (1.5 bilhões de pessoas), ou seja, com pelo menos 33% dos indicadores que refletem a privação aguda em saúde, em educação e nos padrões de vida, e perto de 900 milhões de pessoas podem cair na pobreza se ocorrerem dificuldades - financeiras, naturais ou outras.
Multidimensional Poverty
O trabalho de Milanovic mostra que nos últimos 20 anos o crescimento simultâneo do mundo emergente (principalmente da Ásia), da classe média da China e da Índia e da plutocracia global, foi acompanhado do esvaziamento da classe média ocidental e da negligência dos mais pobres.


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